Abstinência.


Antes era só o saciar, a ânsia não passava do desejo e da futilidade. A vontade deveria ser apenas momentânea, mas naquela hora a experiência se calara, cedera espaço à coragem e aos momentos que corriam marcando cada toque dele com hematomas violentos em sua memória.

Era notório para qualquer um como seria o final daquilo; e a partir do momento em que fincou os pés lá, ela também percebeu que acabaria em um mal acabado. A droga da qual seria, a partir daquele momento, dependente. A saudade não é nada além de uma prova de que o passado valeu a pena. O passado que desapareceu, que passou correndo por eles, se esquivando de tudo que fosse palpável.

Ao menor deslize, os sentimentos que deveriam ser ministrados em doses homeopáticas bobeavam em seu sangue procurando por mais daquilo que abastecia seu corpo.

"Talvez beijo na boca seja menos íntimo que andar de mãos dadas."*

A droga lhe trouxe a calma, mas a cura tornou-se o próprio veneno, enfraquecendo e viciando qualquer organismo que tentasse se defender naquele momento. Ela não tinha mais forças para reagir ao vício, apenas sentiria em doses e mais doses, a entorpecência.

Noite após noite... aquele gosto amargo da ressaca ainda teimava em queimar sua memória. A abstinência ainda lhe causava calafrios enquanto acordava e via que era apenas mais um dia de tantos outros que ainda viriam vazios. O tempo não vinha cumprindo com seu dever; o relógio que ficou, agora já corria naturalmente, contando cada segundo de agonia, enquanto as horas do dia corriam cada vez mais devagar para ela, não apagando o que aconteceu; não saciando a necessidade.

Princípio de reabilitação de dependentes químicos: É necessário querer estar limpo.


Bem na última hora.

A sensação é sempre a mesma: o medo da covardia.

A ânsia não ia ajudar em nada agora, enquanto ela via tudo aquilo passar e deixar os nacos pelo caminho, contando o tempo que insistia em passar rápido demais... Last day.

Quisera poder fazer as horas acompanharem os ponteiros daquele relógio parado que ficou. Queria que o tilintar dos copos, da cordialidade do brinde, fizessem mesmo algum sentido.

"À sua volta." Fingindo não ser aquela a última vez.

"Ainda é muito surreal". Surreal que aquilo tudo tenha acontecido de uma só vez, a maneira na qual se olhavam era irresponsável demais.  Lealdade. Companheirismo. Intensidade.

O jeito como tudo aconteceu não era comum. Nem pareciam todos estranhos... tudo corria tão natural que ela nem percebeu que aqueles não eram seus amigos, mas os dele. Tudo tão incomum. A falta de tudo que aconteceu num espaço de tempo tão curto trouxe consigo sensações que nem ela saberia explicar.

Alívio e frustração por saber que o tempo fará, mais uma vez, o trabalho sujo.
O medo da falta e tudo que ela ainda pode deixar ficar...
Alegria e tristeza pela saudade.
Insanidade.

Um sentimento: distância.
 
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